Reclamar faz parte do grupo de ações que realizamos no piloto automático. É uma reação impulsiva em resposta a situações desagradáveis ou incômodas, como o trânsito pesado, o calor intenso ou problemas com o chefe. Portanto, todos podem ter momentos de maior estresse resultando na reclamação, porém, temos um problema quanto torna-se contínua e permanente na vida, virando um hábito.
O funcionamento de um reclamão
Pessoas que estão habituadas ao modo de “queixa contínua” desenvolvem um padrão de funcionamento onde há grande culpabilização externa. Consequente há a vitimização própria. A culpa é sempre vista como outro, e nunca por uma atitude da própria pessoa. Com o tempo, perdem a capacidade de ouvir-se e de refletir. Este funcionamento impede de enfrentar os problemas, tornando-se um lugar muito cômodo, onde não há a necessidade de reagir.
Ao reclamar constantemente, os problemas tornam-se muito maiores do que realmente são, ocorrendo uma dramatização e maximização do foco negativo, tornando tudo muito difícil de lidar. Estas pessoas tornam-se eternos insatisfeitos, onde nada é atraente ou interessante, a vida fica totalmente sem graça.
O ato de reclamar faz com que a mente fique “mal-acostumada” em função do alivio momentâneo propiciado pela reclamação (mesmo que ninguém tenha escutado). Assim, a sensação é como se tivesse reagido a situação que provocou o desejo de reclamar. O foco se perde, deixando de ser direcionado para a tomada de consciência assertiva acerca do problema.
Como auxiliar o reclamão
Muitas vezes o reclamão tem um funcionamento onde não se percebe dessa forma. Inicialmente, é importante não julga-lo, mas ajuda-lo a enxergar o problema e que precisa fazer um esforço para se controlar e mudar. A pessoa precisa entender que o seu comportamento gera consequências negativas tanto para si, como para as pessoas em sua volta.
Deve-se ser exercitada uma mudança de percepção, onde não deve deixar que pontos negativos estraguem o dia. O foco deve ser alterado para os aspectos positivos, sendo grato por eles. Também, deve-se buscar estar próximo de pessoas positivas, que estimulem essa readaptação e se afastar das negativas, que incentivam o pessimismo.
Em situações onde houveram tentativas para mudar algo desagradável, porém não funcionaram, deve-se aceitar e enfrenta-las. Se, por exemplo, todo dia você precisa ficar um tempo parado no transito ao voltar do trabalho, pense em como aproveitar este tempo, por exemplo ouvindo músicas, noticiário ou um audio-book. Tente o autocontrole da mente, busque refúgios de relaxamento. Reclamar não vai mudar a situação e pode inclusive piora-la, pois com o ato de reclamar vem junto a irritabilidade, um reforçando o outro e crescendo cada vez mais.
Um exercício que pode ser realizado é: Por um dia, toda vez que vier a vontade de reclamar, anote o teor da reclamação em um papel. A noite, leia e reflita: A queixa é legitima? Posso mudar aquela situação? Como? Anote as respostas.
No seguimento dos dias, comprometa-se em tentar solucionar as que foram pensadas saídas. Após, estas entram em uma lista de “proibidas”, onde não podem mais ser passiveis de reclamações. As que não foram encontradas soluções, reflita sobre, muitas vezes só estão nas suas incomodações diárias por alimentação da própria reclamação.
Por fim, estimule a pessoa a ser flexível com ela mesma e a se valorizar. Quando ela perceber a vontade de reclamar, deve pensar em algo que possa agradecer. Com o tempo vai conseguir olhar para trás e enxergar o quanto estava focando nas negatividades e deixando de lado muitas coisas maravilhosas que existem na sua vida.
Como lidar com a convivência com um reclamão
Se preocupar com as pessoas que amamos é saudável, mostra para elas que nos importamos com a sua felicidade. Porém, não podemos deixar a nós mesmos em segundo plano, pois a convivência constante com a negatividade pode nos contaminar e prejudicar.
Pessoas que tem o hábito de reclamar e se vitimizar podem desenvolver a habilidade de promover o sentimento de pena nos demais e a terceirização dos seus problemas. Quando os outros tomam para si esses conflitos, ocorre uma inversão que suga grande quantidade de energia dessas pessoas, as sobrecarregando.
Você pode tentar fazer a sua parte para ajudar pessoas rabugentas, mas é importante identificar os próprios limites. Não esqueça de manter a sua qualidade de vida. Estabelecer estes limites não é uma tarefa fácil, pois tememos que os nossos amados nos percebam como egoístas ou insensíveis. Mas, para evitar prejuízos futuros a nós mesmos, é importante identificar as situações e relacionamentos tóxicos.
Seguem alguns direcionamentos para lidar com pessoas com este padrão de funcionamento:
1. Mantenha uma distância saudável
Quando você perceber que está sendo manipulado com o comportamento de vítima do reclamão, procure estabelecer uma distância saudável. Ou seja, minimamente próxima para não ter que romper o relacionamento. No entanto, suficientemente distante para não ser envolvido pelos seus comportamentos tóxicos. Um exemplo é, continuar visitando a pessoa; mas no momento em que ela começar a queixar-se, não de ouvidos e mude o assunto para algo positivo. Com o tempo a pessoa sentirá a evitação e esse comportamento não vira à tona.
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Seja franco
Quando apenas a evitação não funciona, é preciso ser honesto com a pessoa, pois algumas só compreendem a situação dessa forma. Se você chegou no seu limite, seja sincero sobre os seus sentimentos, mostrando que ela não é uma vítima, mas tem responsabilidades pela situação atual. Explique utilizando exemplos do dia-a-dia para a pessoa conseguir visualizar com mais facilidade.
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Não demonstre “fraqueza”
Pessoas que desenvolvem este funcionamento muitas vezes também tornam-se manipuladoras. Portanto, é fundamental manter-se sério e firme em sua posição e não ceder, por mais que a pessoa insista. Você poderá sentir empatia pela pessoa; mas lembre-se das situações pelas quais te levaram ao limite e siga no controle da situação.
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Defina limites
Este item é extremamente importante, na medida que pessoas com este perfil tentam terceirizar os seus problemas. Todavia, cabe a você definir até onde essa pessoa pode ir com as suas reclamações. Defina limites claros e não permita que a empatia comprometa o controle. E, quando necessário, coloque um ponto final na situação. Assim como o reclamão tem responsabilidades para consigo, você também tem com a sua saúde emocional e mental.
Por fim, fica a ressalva de que, as pessoas descritas como “reclamonas”, podem estar desenvolvendo um quadro de depressão ou outro transtorno mental. Assim, reclamar constantemente sugere que algo não está bem emocionalmente. Serve como um aviso; indica que está na hora de promover mudanças ou procurar ajuda especializada para retornar a graça dos seus dias.
Portanto, é extremamente importante incentivar essa pessoa a buscar uma avaliação com um psicólogo ou psiquiatra para auxilia-la a compreender a situação.
Psic. Graziela Dengo – CRP 07/29030
Psicóloga Clínica, Pós-Graduanda em Terapia Sistêmica